Um morador no meu estômago!

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A música começou a ficar pesada, os corpos incomodavam, os rostos tornavam-se cada vez mais estranhos. E eu bebia mais para tentar entrar no clima. Me abraçavam, cantavam, dançavam comigo. Me beijavam a testa, bochecha e os lábios.
Sentia temperaturas, toques e mãos, e num tranco inesperado estava eu, mais uma vez, grudada com um cara qualquer na parede. Nunca perguntei o nome, não sei quantos anos eles tinham ou o que faziam. Na verdade, mal os enxergava. Na maioria das vezes, era assim.
Sempre tomei Tequila, Vodka, Whisky. Fumava vários cigarros, conversava com o barman muito meu “amigo”, e observava todas aquelas pessoas. Elas estavam muito felizes, engraçadas, simpáticas umas com as outras. Sem problemas em compartilhar do mesmo copo, música, e bocas. Não há preconceito, não há solidão, não estão incompletas…Ou estão?

Ouvia sempre o mesmo set, passava na mesma caixa, comia o mesmo Hot Dog da tia da esquina. Fazia o mesmo trajeto de volta para casa, com o mesmo frio, com o mesmo olhar perdido tentando achar alguém conhecido; e com o vazio. É, o vazio.  Aquele que não aquieta. Que está presente desde a hora que acordo, até a hora que tomo o remédio para insônia.

Eu já estou muito acostumada com ele. É como se fosse meu. Já fizesse parte. Se tornou uma espécie de amigo. Não sei explicar, mas é uma sensaçãozinha no fundo do estômago, como se morasse um bichinho ali, e eu o alimentasse ás vezes. Mas a fome dele é tão grande, que vive me pedindo comida. E eu já não sei mais o que fazer para saciá-lo.

Ele me dá pistas: mostra sonhos, fotos, momentos, pessoas. Na realidade, menciona aquela pessoa em específico. Eu sempre digo a ele que infelizmente essas coisas estão distantes, e talvez, eu não consiga alcança – las, outras, encontrá-las novamente. Só que não adianta, esse bichinho é teimoso, e ele grita por essas coisas.

Eu tento proporcionar à ele momentos de prazer.É o que eu andava fazendo há alguns meses. Levava para passear, para conhecer gente nova, comer em restaurantes novos, sempre um prato diferente, mas pra ele, nunca saboroso o bastante. Tentei até algumas vezes, apresentá-lo a rostos semelhantes, situações parecidas, desejos similares aos que ele mendigava, porém chegou um momento que não deu mais para tapeá-lo.
Quando  ia dormir, ele não parava de resmungar, até que eu abrisse o celular e mostrasse uma foto ou vídeo. Ou revivesse alguma “historinha inventada” mas dessa vez com um final feliz.

E a dor de estômago só piorava, todas as vezes que eu contava sobre os planos para o final de semana: “De novo essa balada” “De novo essas pessoas” “Vai sozinha outra vez?”, ele chiava.

Isso tudo foi me atingindo muito, e então, parei para analisar o porque de não conseguir mais fazer o meu bichinho feliz. Assim, comecei a reparar nos lugares que eu o levava, nas minhas atitudes com ele, dei mais atenção as suas queixas, conversei com outras pessoas que sofriam com este mesmo problema, e entendi: eu não estava o alimentando com coisas sustentáveis.

A verdade, é que alimentamos nosso “vazio de estimação” com mais vazio. Encontramos a “comida” em lugares com valores superficiais. Conhecemos pessoas rasas, passageiras, e muitas vezes, até interesseiras. Sem nada a agregar. Estacionamos num conforto em que, não há espaço para enxergar o novo. Criamos uma casca, fazemos as mesmas coisas. Não buscamos nos renovar, aprender, cultivar.  Ou até mesmo, tentar buscar o que/quem você sente falta. Aquilo que te preenche.

Ficamos tão desesperados com essa sensação de oco por dentro que o nosso amiguinho vazio nos trás, e acabamos enfiando só porcaria goela abaixo. Não há uma peneira. Precisamos de prazer, e rápido.  Não dá tempo de escolher o melhor tomate, vai aquele machucadinho mesmo. E nessa que perdemos muito tempo, e fazemos nosso bichinho sofrer ainda mais.

Então, pra você que está ai sem saber o que fazer com seu bichinho chamado vazio, não existe segredo, não. É simples de resolver: reeducação alimentar. Corte o supérfluo, e engula o indispensável. É tiro e queda. Não tem erro.

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