Perdoar não apaga a dor

Não tem sido fácil. Existe o amor, mas existe a sombra do erro. Houve perdão, mas as feridas estão expostas, as vezes ainda sangram. Nós sabíamos que não seria flores, mas não estávamos equipados para encontrar a floresta de espinhos. Ninguém nos ensinou que o perdão não apaga o passado, ele só sinaliza a disposição de desenhar um novo futuro. O perdão pode ser remédio pra dor, mas ainda não é anestesia, e muito menos uma pistola de cola quente que vai remendar o que se quebrou.

Existem momentos que parecemos ter superado, de volta aos tempos do velho e inocente amor, que só queria o bem do outro e com isso alcançava o seu próprio bem. Quando estamos longe da rotina, em algum país que fala outro idioma, vendo lugares bonitos, exilados na companhia um do outro, parece que superamos. Como se a crise houvesse nos unido, tornado o nosso amor um exemplo inabalável, maduro e resistente.

Quando voltamos ao fuso horário padrão, a insegurança vem na mala. Então a gente começa a se sentir pequeno na presença um do outro, intimidado, julgado e condenado. Na atmosfera de trabalhos e compromissos, onde não é possível ficar na cama a tarde inteira, em segurança e longe dos ruídos, a gente cai, a gente lembra. Lembra das lágrimas e das distâncias e não consegue resistir a culpa.

Tem tanta culpa entre nós, ocupando cada espaço vazio da casa e da agenda. Tanto pensamento que machuca e assuntos que ainda não tivemos coragem de acessar. A gente segue se machucando pelo silêncio, em nome de não machucar o outro, tentando cumprir com as exigências sociais que o perdão nos obriga. Enquanto um chora de insegurança no banho, e o outro se afunda em estudos pra sobrar menos espaço pra lamentar. A gente tem andado no desajuste, no desconforto, pisando em ovos até pra dar bom dia. Na beira do abismo, onde nosso amor vai cair e quebrar de novo, mas dessa vez não vai ser surpresa, vai ser alívio.

Talvez nosso plano mirabolante no fim das contas seja ter um novo motivo para expor o que ainda ficou guardado. Um álibi para desistir de vez, com o discurso hipócrita de que “pelo menos tentamos”.

Não existe tentativa sem verdade, sem sinceridade, sem a capacidade de dizer o quanto ainda dói e que o amor não tem conseguido minimizar a angústia. A gente apostou tão alto nesse amor que não temos coragem de declarar o fracasso. É amor e orgulho, amor e teimosia, amor e a ausência de um plano b, uma saída de emergência.

Seguimos na utópica teoria que vamos encontrar a salvação, juntos, talvez em uma mensagem de horóscopo no Diário Popular de um domingo, que vai parecer um sinal do céu. Uma receita mágica, como um bolinho de micro-ondas, e em 40 segundos vamos ter superado e recomeçando. Vamos ter o amor de novo, sem veneno, sem adulteração, manipulação, bagagem negativa. Só o amor puro que um dia existiu, cujo a lembrança nos mantém de mãos dadas, na expectativa de reviver esse amor.

Deborah Anttuart

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