“Ninguém precisa entender”, ouviu. Nesse momento ela pensou que não tinha mesmo a pretensão de explicar, porque achava que ninguém entenderia de fato. Não era para ser entendido nem mesmo por ela.
Mas precisava, precisava e precisava sentir. E era assim, quando não fazia nada e deixava a mente passear nas páginas de um livro qualquer, regadas ao café morno, que sentia ser incapaz de não sentir.
Alguém entenderia. E ela nunca precisaria explicar. Mas seria bom, pensava, se alguém pudesse lê-la e interpretá-la. Se nas páginas de um livro qualquer ela lesse transcrito seus pensamentos mais ocultos, inteligíveis, inatingíveis.
No que não precisava ser explicado, no café esfriando, na leitura avulsa e dispersa, no silêncio barulhento do peito, no futuro que possivelmente não tinha espaço nesse plano, mas que era certo, desses do conforto das certezas que se pode ter sem medo e sem expectativas, existia o que ninguém entenderia e ela nunca poderia ou precisaria explicar.
Pensou na sinédoque expressa no “ninguém”. Haveria alguém. Alguém que soubesse transcrever, que compreendesse o sentir, que recebesse e devolvesse aquela imensidão. Enquanto tomava o café agora frio, enquanto lia uma coisa qualquer que o barulho da alma não lhe permitia registrar, enquanto sentia abnegada que nem tudo é para ser entendido, ou explicado, mas que não se impede que seja sentido, enquanto esperava esquecer o desconhecido e desejava uma lembrança eterna, enquanto sentimentos antagônicos lhe conduziam o espírito para caminhos ricos, desconhecidos…
Enquanto isso o café de frio precisava de leite para aquecer aquela caneca, conectar os pensamentos nas páginas passadas, lidas e não plenamente entendidas. Enquanto isso alguém a transcrevia… Enquanto isso ela sentia, e entendia. Alguém entenderia.
Enviado por Luciana Marques
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