Me deixa ficar só mais um pouquinho

A gente não se conhece nem há quatro semanas completas, mas você já me conhece mais do que muita gente que há dezenove anos sabe que eu existo.

Eu acho que nunca te falei qual o nome do cachorro que eu nunca tive, embora já tenha te falado do tio Toninho, daquele amigo que fiz no cursinho, da moça daquela locadora que sempre tem uma comédia na manga pra indicar. E por mais que eu não esteja a fim de saber o que você almoçou quinta passada ou em quem vai votar nas eleições, eu queria saber um pouco mais de você.

Você é como aqueles livros que a gente nem começou a ler, mas já tá doido pra saber o que vai acontecer no decorrer das páginas. É como uma sinopse, que diz tão pouco da obra, mas que parece ter muito mais pra contar.

Eu sei que falo demais, que a minha ansiedade quase sempre estoura, e o remédio que o médico receitou nem sequer fez efeito. Eu também sei que sinto muito, apesar disso não ser uma desculpa. Mas, mesmo assim, quando você me encaixa no seu abraço, você abraça quem eu sou: desse jeito todo rabiscado, com tanta bagunça pra arrumar, uns medos pra deixar pra lá e uma vontade de correr por este mundo mesmo que com um esporão em cada pé. E, quando isso acontece, eu juro que sinto que te conheço um pouco mais, mesmo sem você dizer nada.

Todo mundo já ouviu falar de São Paulo. Muitos a conhecem, outros a conhecem tanto que até a chamam de casa. E, apesar de conhecer, a gente se surpreende com ela. A cada hora, a cada horário de pico, a cada esquina que a gente nem achava que existia e acaba fazendo um atalho. A cada restaurante novo que abre e o tempo que se fecha, e o sol que sai de novo, e o casaco que põe, e que tira. Você é como a São Paulo que eu quero conhecer cada canto, cada alameda da Paulista, tantas ruas sem saída pra não sair mais. É como a Paris que tantos só enxergam a Torre Eiffel, o Rio que muitos limitam a vista ao Corcovado, mas que vão muito além dos cartões postais ou do seu olho castanho.

Nesse seu mundo eu não quero ser só mais um turista, que vem pra visitar, tirar umas fotos pra guardar na memória – por vezes só a do celular – e que já tá com a passagem de volta comprada. Me deixa ficar só mais um pouco, e depois um pouco mais, porque ainda tem muita coisa pra se ver, umas manias locais pra se acostumar e lugares pra visitar que só quem é daí sabe o caminho.

Entre uma pessoa que esbarra na outra quando a porta do vagão se abre, um papo sobre a possibilidade de chuva que vai, outro que vem e que, quando a gente percebe, nem precisou estar nela pra se molhar. Entre uma fila de pão e uma do cinema de quarta, um olhar que acertou outro quando ninguém estava vendo, um match num aplicativo qualquer, você chegou sem avisar que vinha e foi logo segurando a minha mão e me dando uma dose de motivos pra eu sorrir. Mesmo sabendo que eu sorrio só de olhar pra você.

Eu prometo não incomodar, nem fazer tanto barulho. É que eu só quero saber um pouco mais de você.

(ou talvez eu só queira ficar mais tempo ao seu lado.)

Gustavo Meneses

Compartilhe:
Rolar para cima