A crise dos 20 e tantos

Não é novidade para ninguém que a vida é dividida em fases. Não estou me referindo a nascer, crescer e morrer. Me refiro aos sub-estágios da vida: escola primária, ensino médio (ou seja como for que chamam nos dias de hoje), a primeira paixão, a primeira perda, trabalho, casamento, filhos… E por ai vai. Quando somos crianças, temos aquela vontade imensa de crescer logo e nos tornarmos tão perfeitos e indestrutíveis quanto nossos pais, quase uma euforia. Mas eis que as tais fases da vida vão passando, vamos crescendo e abandonando essa ideia de forma tão suave que nem nos damos conta. Vamos dormir em uma noite e quando acordamos, abrimos os olhos e percebemos que aqueles tão incômodos cabelos brancos já começam a surgir. E dependendo da pessoa eles podem aparecer muito mais cedo que se espera, e eu escrevo por experiência própria.

 

Costumamos ouvir muito falar da clássica crise dos quarenta anos. Aquele momento em que o sujeito percebe que ele ligou o botão de piloto automático da vida, mas não está mais curtindo o passeio. Odeia as segundas-feiras na mesma proporção que ama as sextas. Já não tem vontade alguma de pensar naquela promoção do escritório que antes faziam seus olhos brilharem. Chegou o momento em que surge uma pequena ideia que consome os pensamentos, como um parasita que rasteja e, não importa em qual posição você fique, sempre vai incomodar da mesma forma: “talvez eu não esteja onde deveria estar.”

 

Com a crise dos 20 e tantos não é tão diferente. Na verdade, os sintomas são exatamente os mesmos. Você está lá, no último ano da escola, contando os dias para aguardada formatura e já está pensando no que vai escolher cursar na faculdade. É assim que funciona, não é? Somos praticamente pressionados desde cedo a pensar em uma carreira, estudar, fazer vestibular, cursar a faculdade e arranjar um emprego. É a roda da vida. Você estuda durante anos, faz contatos, passa por diversos empregos até que finalmente se forma. É nesse momento que tem certeza que as coisas estão dando certo, aquela sensação de “agora vai”. E para muitos é assim mesmo que acontece. Mas nem para todos.

 

Aquela felicidade e euforia de antes vão desaparecendo aos poucos, as emoções boas vão se perdendo pelo caminho. Elas vão caindo e ficando no relógio ponto (sempre atrasado), na xícara de café sem gosto, na pilha de papeis empilhados na mesa, no som do telefone tocando, no sol se pondo através das persianas. A vida andou e você não, ou ao menos certamente não se sente assim. Então… é isso? É só isso? Foi para isso que você passou todos aqueles anos se dando tudo de si?

 

“Escolha um trabalho que você ame e você nunca terá que trabalhar um dia em sua vida.” – Confúcio

 

Se você, caro leitor, leu a famosa frase acima com pesar nos olhos e seguido de um suspiro, você provavelmente está na crise dos vinte e tantos. Uma infelicidade, certamente, mas não existe vergonha alguma nisso. É mais uma fase da vida, e uma que deve ser manejada com cautela. Existe uma linha bem perceptível entre “gosto do que faço” e o “chega logo sábado”, e você vai perceber sem dificuldade alguma caso já tenha cruzado essa linha. Se esse realmente é o caso, é preciso refletir. Sobre absolutamente tudo.

 

Não tenha medo de rever conceitos. Quem você é ou quem gostaria de ser quando estava na faculdade pode não ser mais o mesmo agora. Faça um favor para si mesmo e desligue o celular por um momento. Senta na varanda (ou onde se sentir mais a vontade) e começa um interrogatório próprio, onde você é o policial bonzinho e o malvado ao mesmo tempo. Quem é você, de verdade? Se você fosse morrer semana que vem, o que gostaria de fazer até lá? E por que não está fazendo isso ainda? É isso mesmo que você quer? O que é realmente importante para você? Em uma visão totalmente utópica, como você gostaria de estar agora e no futuro?

 

As respostas não vão vir com facilidade. O importante é que elas te encontrem, não importa quanto tempo for necessário. Depois, a pergunta principal é “o que eu vou fazer para atingir isso”. Platão dizia que para resolver um grande problema, é preciso transforma-lo em vários pequenos problemas. Encare seu problema, seja ele qual for. Está na empresa errada? Troque. Está na área errada? Troque também. O importante é não aceitar o desconforto. Aqui, o ditado “aceita que dói menos” não tem lugar. Vá devagar, com calma e cautela. Só porque você não tem 40 anos não significa que não possa repensar toda sua vida. Na verdade, é até melhor que o faça agora.

 

E quem sabe, talvez você acabe descobrindo oportunidades que antes jamais lhe cruzariam a cabeça.

Enviado por Thales Ludwig Valentini

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