Poupe-se de ser uma testemunha medíocre e cega, que atesta diante de Deus e dos homens a veracidade do amor. Veja bem, não se vive amor sem mentiras. Sem devaneios, exageros ou omissões. O amor naturalmente sabe o momento de distorcer a realidade em prol de nobre causa, buscando pintar o cotidiano com cores mais amáveis ou, minimamente, suportáveis.
O amor tem desespero pela felicidade, mas nenhum pacto que lhe obrigue a dizer a verdade, somente a verdade e nada mais que a verdade, por isso, vez ou outra vende sua alma ao inferno em sacrifícios de mentiras, grandes ou pequenas, perdoáveis ou condenáveis.
O heroico e nobre sentimento, aclamado e defendido, utiliza-se dos fins para justificar os meios. Te faz fechar os olhos para o medo do escuro, afirmando não existir nada de baixo da cama ou dentro do armário. Te declara paixão escrita, em dias de apatia. Elogia tempero sem sabor, a roupa sem corte, e ainda é capaz de aplaudir entusiasmado e orgulhoso o clichê em suas diversas faces.
Não há amor sem mentiras. O amor tem urgência em proteger, tem zelo maternal e incondicional. E não há melhor forma de proteção do que a privação da realidade. A verdade, sendo relativa ou não, dói, segrega, desmotiva. É então que o altruísmo do amor entra em ação, passando por cima de sua consciência de certo e errado, mentindo, dizendo exatamente o que deseja ser ouvido. A mentira não desmerece o amor, pelo contrário. Confere-lhe um toque de sacrifício. O Cristo dos sentimentos. Que vem para salvar-nos de nosso pacote infindável de defeitos e pecados, e através de sua utópica fé na humanidade, nos entrega em mãos a confiança no que ainda podemos ser. O amor mente justamente porque é amor.