Essa não é uma crônica sobre o amor

A gente se conheceu quando eu ainda tinha 20 e poucos, numa festa de faculdade. Ficamos, ele era bonitinho, mas nunca fez o meu tipo. Eu não estava muito a fim não, sabe? Sei lá, não me despertou qualquer tipo de paixão ou coisa parecida. Mas a noite tava chata, a bebida tava no sangue e minhas amigas me deixaram pra ficar com sei lá quem. Então eu embarquei. E foi bom… Tão bom que hoje, aos trinta, dez anos depois, casada e formada, me peguei pensando nisso.
O senso comum dizia que eu nunca poderia encontrar alguém tão legal numa choppada de direito, as duas da manhã. Mas ele tava errado, como sempre.
Conversamos sobre tantas coisas. Das mais úteis até as mais inúteis. Ele me contou sobre as férias na Tailândia e eu contei a ele sobre a minha rotina tediosa no estágio. Eu gostei da tatuagem no braço direito dele, mas nunca soube o real significado dela.
Mas, antes de tudo, eu preciso avisar uma coisa.
Essa não é uma crônica de amor, que fique bem claro. Eu só estava… Não sei. Só parei pra refletir e lembrei dos olhos dele. E em tudo que a gente poderia ter sido. Bem, eu não fui, tampouco sou apaixonada por ele. Eu sou apaixonada pelo o que a gente poderia ter sido. Pelas conversas boas da noite que poderiam ter sido prolongadas até o dia seguinte. Por tudo o que eu quis, imaginei e pensei. Pelas praias que poderiam ter sido visitadas por nós e pelas músicas que poderiam ter sido nossas.
Lembro que ele me deu a mão e disse que adorava viajar, e aí eu viajei. Viajei num futuro que jamais se realizaria, num amanhã que nunca existiria, num namoro que não aconteceria. 
Não sei bem se acredito em destino, mas se ele existe, não gostou de nós dois.
Repito, essa não é uma crônica de amor. É sobre um quase amor. Quase. Nós nunca saímos do quase e nunca sairemos. Talvez a gente nunca mais se veja e eu nunca decifre o significado da sua tatuagem. Talvez, só talvez, ele se lembre de mim, de vez em quando. Quando Vanguart tocar no som do seu carro a caminho do trabalho. Quando o Sol nascer de manhã. Quando surgir uma foto minha numa rede social qualquer.
Ou talvez ele nem se lembre mais de mim, o que não me importa, realmente. Essa não é uma crônica sobre o amor. É sobre a dúvida que ele deixou em mim, sobre os meios que não justificaram os fins. 
Não houve um fim. Ou um começo.
Essa não é uma crônica sobre o amor. Até porque eu já amo outra pessoa. Mas essa história mal acabada permanece na minha cabeça dia e noite, porque eu não consigo me contentar com o pouco que ele deixou. É sobre a frase inacabada que ele escreveu no meu destino. E eu odeio coisas mal feitas. Eu odeio o que vem pela metade. 
E tudo que eu guardo na memória eu já nem sei se é real. Faz tanto tempo.
Nós fomos arranjos temporários. Quebra cabeças que não se encaixaram. Um teste que a vida promoveu pra ver se daria certo. Pra ver se ensinava alguma coisa. 
O nosso teste deu negativo, o universo não conspirou, o destino não quis, Deus não deixou.
Ou talvez eu não tenha tentado o suficiente, mas prefiro colocar a culpa em algum outro motivo sobrenatural na tentativa de lidar com o fracasso dessa história.
Essa não foi uma crônica sobre o amor. Mas poderia ter sido.
Bruna Frotté
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