O oposto do amor

Na varanda, um está fumando o cigarro quase acabado, seguido anteriormente por dois já mortos no cinzeiro, olhando para o horizonte declinado sobre o rancor, buscando fixar o olhar em qualquer lugar que tire seus pés dali! Camisa amassada, jeans desbotado e frieza no semblante representam o lado que não quer se submeter.

O outro, está no quarto, desdobrando as roupas enquanto as joga em malas e bolsas semiabertas, sem escolher muito o que levar de prontidão… Meia caixa de chocolate aberta, unhas comidas e porta trancada! Olhos inchados, mãos calejadas, hematomas na alma e desejos de solidão representam o lado que não quer se abater.

Falta de carinho? Detalhes? Disponibilidade? Atenção? Sexo?… Os motivos alegados já passam dos dedos das mãos e tornam a decisão quase que aceitável para os dois. Nenhum tem desejos de felicidades para o outro… O único e indispensável agora, é a separação!

A arrogância e a superioridade que ambos tentam passar os fazem abraçar os medos como se essa fosse uma demonstração que de alguma forma “um estará melhor sem o outro”. A sensação de saudade que levemente já bate a porta é ignorada pela fechadura do orgulho, que impiedosamente, insiste em não abrir enquanto mascaram uma certeza de que agora o melhor é um do lado de dentro e outro do lado de fora!

Os minutos vão passando… Dez, vinte, trinta, quarenta… E a cada instante é possível sentir a distância entre os corações aumentando em quilômetros! Cada foto virada de ponta cabeça, cada acessório jogado fora, cada carta queimada, cada peça de roupa descartada… Tudo o que era compartilhado é dividido como pagamento de um pedágio sem volta.

Tantas coisas ditas que não são verdades e tantas verdades que não foram ditas são representadas por um silêncio que grita palavras presas ao peito!

Entre um cômodo e outro os móveis são poucos, mas o vazio do sentir já ocupa um espaço imenso, fazendo os dois sentirem o aperto dos maus comportamentos em cada passo dado, tornando insuportável compartilhar os mesmos metros quadrados.

É hora de um ficar e o outro ir embora! Um tiro só! Sem despedidas, sem conversas, sem arrependimentos… O táxi já aguarda no portão! Ironicamente, a chuva forte que cai lá fora e entra pela janela molha os rostos melancólicos disfarçando as incontáveis lágrimas que escorrem dos olhos.

Será que foi amor? Será que é amor? Onde exatamente estava o erro? Por que o outro fez ou deixou de fazer algo?… As perguntas são como balas de fuzil que entram no peito sem pestanejar! A diferença para os dois, é que um tiro de fuzil mata na hora! Essas perguntas vão matá-los pouco a pouco, mês a mês, dia após dia… As possibilidades e impossibilidades das pessoas em fazer algo diferente depois de uma ação infeliz, matam muito mais do que doenças crônicas! Explicar o inexplicável é tarefa que corrói o coração.

Talvez, com o dicionário de respostas que o tempo se encarrega de trazer, os dois, depois de muito se odiar e encher o peito com rancor e desejos de arrependimento alheio, entendam que o oposto do amor nunca foi o ódio, o oposto do amor é a indiferença.

Leonardo Cabral

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